Oitava Colina

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9/24/2006

Aula 15, ou: Perfume ruim de flores inexistentes

Um tomate é plantado, colhido, transportado e vendido num supermercado, mas apodrece e acaba no lixo. Acaba? Não. ILHA DAS FLORES segue-o até seu verdadeiro final, entre animais, lixo, mulheres e crianças. E então fica clara a diferença que existe entre tomates, porcos e seres humanos.
Nesta aula, assistimos o documentário Ilha das Flores (Brasil, 1989, direção de Jorge Furtado, narração de Paulo José); de uma maneira direta e crítica, esse filme mostra que ainda falta muito - mas muito mesmo - para que o ser humano seja de fato humano com o seu próximo, a partir da realidade de uma região usada como lixão numa cidade do Sul brasileiro.
De maneira progressiva, a narração do filme mostra o capitalismo em 3 etapas: produção e comércio de produtos, uso e eliminação desses produtos e, finalmente, o reaproveitamento do que restou desses produtos. Trocando em miúdos e de acordo com o roteiro do filme: a) o processo de produção de tomates e sua comercialização; b) a utilização dos tomates na culinária e o descarte de seus restos no lixo; c) as pessoas que vão recolher os restos de tomate no lixo, para poderem sobreviver.
É sem dúvida uma realidade triste, mas que se torna revoltante por um detalhe: no filme, há quem não permita que as pessoas que fazem do lixo sua fonte de alimentação aproveitem tudo o que possa ser aproveitado. É isso mesmo. Pessoas que criam porcos (para vender, obviamente) são as primeiras a terem prioridade, e só depois de terem recolhido todos os detritos de alimentos é que permitem que as mulheres e as crianças miseráveis da ilha recolham o que sobrou - e em 5 minutos. Ou seja, os porcos possuem mais valor que as pessoas. Se pelo menos aqueles porcos fossem dados aos moradores pobres... mas o dono do porco é igual àquela música dos Titãs que tanto ouvi quando pequena: homem primata, capitalismo selvagem.
Isso é algo em que se pensar... nossos políticos - sejam eles de esquerda, de direita, de centro, de nada - vivem assegurando que o país está bem, que há desenvolvimento, que aqui é um lugar bom de se viver, mas o fato de existirem lugares em que as pessoas miseráveis sequer podem ser as primeiras a usarem os restos - o que já é por si uma atitude humilhante e indigna de um ser humano fazer - mostra que entre o falar bonito das autoridades e o quadro deplorável de grande parte da população há um enorme abismo, povoado de omissão e interesses mesquinhos que se tornam alheios ao bem comum dos cidadãos. E é esse abismo que faz da Ilha das Flores um lugar onde as flores só existem no nome, porque não há nenhuma flor nessa ilha, só o cheiro podre do lixo, dos chiqueiros e da falta de consideração para com quem necessita de comida, de respeito e de cidadania.
Através desse vídeo percebemos que é preciso denunciar a dura realidade e cobrar providências para que cessem a desigualdade social e as injustiças. Tarefa que não deve ser feita apenas por cineastas, mas também por jornalistas, professores, religiosos, trabalhadores, donas de casa, por mim, por você e por todos que estão cansados de ver seres humanos que vivem sem saber que humanos são.
Roteiro original e na íntegra aqui: http://www.casacinepoa.com.br/port/roteiros/ilhafl2.txt

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Puxa vida, mas o Sul do Brasil não é quase um primeiro mundo? Que coisa, que coisa...